A Polícia Civil de São Paulo está investigando 11 casos de suspeitas de fraudes em partidas de futebol.
Uma das partidas em investigação é no jogo do Batatais, em que os jogadores supostamente estavam forçando escanteios para benefício de apostadores.
Em jogo contra o XV de Jaú, o zagueiro do Batatais, Everton, apresentou comportamentos incomuns, em que cedeu escanteio para a equipe rival.
O jogo ainda apresentou 11 lances semelhantes na primeira parte do jogo, ações em que os jogadores do Batatais contrariavam a lógica.
Em junho deste ano, sete jogadores e membros da comissão técnica foram demitidos pelo presidente do Batatais, Reginaldo Barbo. Essas ações eram chefiadas pelo Decio Antonio Toledo Soares, conhecido como Ednam.
O presidente deu a seguinte declaração para a equipe do GE:
É melhor tocar com a equipe da base, que veste nossa camisa, do que continuar tomando sapatada e eles ganhando dinheiro com manipulação de resultado.
Barbo ainda disse que apenas um jogador questionou a rescisão do contrato. O jogador foi o meia, Ronildo Barbosa, que admitiu em uma conversa gravada sem ele saber, sobre o convite que recebeu dos colegas de clube, para participar dos esquemas de manipulação de resultados.
Ele disse que recebeu a proposta de receber R$2,5 mil para ajudar a cumprir a meta de escanteios. Esse valor era o equivalente ao dobro do salário que ele recebia no clube. O jogador afirmou ter recusado a proposta.
Everton Fernandes, Wagner Leite, David Ciderlan, Lucivaldo da Silva, Vitor Igor Barreto e José Carlos Filho, foram os outros atletas que deixaram o time e também alegaram ter recusado a proposta.
Em conversa com o GE, o jogador admitiu o convite para o esquema de manipulação. Veja os vídeos através do site do GE.
Além desse caso, a Polícia Civil de São Paulo investiga outros 11 casos. Assim como esse do Batatais, os outros times em investigação atuam por campeonatos com pouca visibilidade.
Nessa lista tem partidas do Paulista Sub-20, do estadual feminino e da quarta divisão em São Paulo.
Esses casos são mais comuns em jogos de divisões inferiores, onde existe menos repercussão e o salário dos atletas às vezes nem chega a um salário mínimo. Com isso, aqueles que tentam fraudar os jogos, encontram jogadores mais fragilizados e que estão dispostos a receber um pouco mais de dinheiro, e aceitam participar da manipulação dos jogos.
Pela falta da regulamentação adequada para o país, casas de apostas são criadas com mais facilidade e sem tantas restrições.
Segundo o delegado Cesar Saad, titular da Drade (Delegacia de Repressão aos Delitos de Intolerância Esportiva), de São Paulo, o aumento da criação de casas de apostas, atrelado ao baixo salário que os jogadores das divisões inferiores recebem, resultam nesses casos:
Os casos aumentaram, mas não só no estado de São Paulo. Isso é devido à criação de muitos sites e aplicativos de aposta. Outra questão são os baixos salários, isso para não dizer de atletas que às vezes nem recebem.
A Federação Paulista de Futebol fechou parcerias há alguns anos com especialistas de monitoramento de fraudes, para tentar identificar as partidas suspeitas de fraude.
O trabalho dessas empresas especializadas agem conforme o número de apostas consideradas incomuns, ou quando há um grande número de apostas em uma equipe apontada como zebra.
O presidente do Comitê de Integridade da FPF, Paulo Schimitt, explicou sobre essa parceira:
A gente estava absolutamente no escuro até 2015, 2016. A Federação Paulista foi a primeira que implementou um programa de integridade, contratou empresa especializada para monitorar partidas. É muito difícil que algo chame a atenção do mercado de apostas e a gente não tenha conhecimento total.
Nesse caso da equipe do Batatais, a denúncia partiu do próprio presidente da equipe, que relatou para a Federação Paulista a possível fraude.
Esse posicionamento do presidente foi semelhante ao feito pela equipe do Santos, que denunciou um funcionário do clube que tentava aliciar uma atleta do Red Bull Bragantino antes de um jogo pelo Paulista feminino.
Schimitt acredita que as palestras de conscientização ajudam a manter a integridade no futebol paulista:
(Os dirigentes) quando ouvem essas palestras, compartilham informações, lembram de algum caso suspeito. A ideia é estimular denúncias. Às vezes o monitoramento não consegue varrer tudo.
Reginaldo Barbo, também contou que outras pessoas foram procurá-lo por problemas parecidos:
Eu recebi comentários de pessoas que também achavam que estavam passando por isso. Recebi ligações de pessoas (que diziam): “Presidente, também estamos investigando aqui”
Mesmo assim, há o temor de que as fraudes se tornem mais comuns e deixem de ser um problema só de campeonatos de pouca expressão.
O delegado Saad ainda falou sobre a dificuldade da investigação nestes casos:
O crime de manipulação é um em que a materialidade da prova é difícil de colher. É difícil de dizer se um jogador chutou aquela bola para fora de propósito, se foi erro técnico, algo físico. Isso dificulta nosso trabalho.
Manipular resultados esportivos são configurados como um crime aqui no Brasil, e na semana passada houve uma condenação para uma investigação de 2016, em que a Polícia Civil de São Paulo estavam buscando indícios para a Operação Game Over, cujo objetivo era acabar com as quadrilhas que fraudavam placares de jogos no Brasil.
Essa operação levou à 11 pessoas, que incluía estrangeiros envolvidos no crime de manipulação e associação criminosa. Devido a isso, a polícia teve permissão de usar outro tipo de ferramentas, como escutas telefônicas, a fim de colher mais provas para o caso.
A quadrilha atuou no estado de São Paulo e em campeonatos na região do Nordeste, e cogitaram até assumir a gestão de um clube para facilitar os golpes.
Os 11 réus foram condenados a dez anos e oito meses de prisão, mas poderão recorrer em liberdade
Conforme o GE, as entidades que trabalham na prevenção e fraudes, estipulam um faturamento das casas de apostas aproximado de 1,5 trilhão de euros, o equivalente a R$ 8 trilhões.
No ano de 2018, o ex-presidente Michel Temer sancionou a lei que permitia as apostas esportivas no Brasil.
O advogado Fabiano Jantalia, especializado no mercado das apostas esportivas, deu a seguinte declaração para o GE:
Só o fato de a lei ter sido publicada fez com que investidores estrangeiros se aproximassem do Brasil, só que elas ainda não podem explorar essa atividade sediadas no Brasil, já que essa matéria ainda depende de regulamentação.
Ele ainda falou sobre os valores que o país deixa de arrecadar:
Perde o país, que não pode recolher tributos. E perde o consumidor, que não tem ninguém a quem recorrer. Para você ajuizar uma ação, você vai precisar indicar um endereço, um responsável legal, uma sede, um CNPJ, e ainda que você localize alguém, você também vai precisar de ter patrimônio para ser executado.
Ainda conforme o site do GE, o advogado falou que as casas de apostas que se comprometem com serviços de integridade, usufruem de ferramentas para monitorar e prevenir casos de manipulação.
A casa de apostas vai lucrar com qualquer resultado, mas a manipulação cria um risco reputacional. As casas que pretendem se impor no mercado têm total interesse no combate à manipulação.
Temos notícias de que algumas casas têm colocado cláusulas nos patrocínios que permitem a rescisão do acordo se for constatado que atletas tiveram envolvimento com manipulação.
O GE ainda falou sobre a atuação da Sportradar, a empresa especializada em combate a fraudes e manipulação, que trabalha junto à FIFA. Para a Copa do Mundo 2022, a Sportradar e a FIFA fizeram parceria com a Interpol e FBI, visando monitorar os mercados de apostas e ações em tempo real dos jogos.